Por Marcela Rodrigues – Boston Globe
A família do jovem brasileiro João Marciano do Carmo, de 19 anos, vive momentos de desespero e incerteza desde que ele foi detido por agentes do Serviço de Imigração e Controle de Alfândega dos Estados Unidos (ICE) na manhã de sábado, em Milford, Massachusetts. Passadas quase 36 horas após a prisão, os pais e a irmã de João ainda não sabem onde ele está ou se está bem.
No domingo, a mãe de João, Ana Geralda do Carmo, aguardava ansiosamente por qualquer notícia em sua casa, acompanhada do marido e da filha de 8 anos. “Tudo o que eu quero é saber se ele está vivo”, disse Ana, emocionada.
Segundo relatos da família, João, que chegou aos Estados Unidos aos 11 anos, foi abordado pelos agentes do ICE enquanto seguia para o trabalho em uma fazenda local. Dois colegas que estavam no carro com ele também foram detidos, conforme testemunhas informaram aos familiares. O veículo foi encontrado depois, com um dos vidros quebrados, estacionado em um estacionamento da Verizon próximo à Main Street de Milford.
A apreensão da família aumenta diante da falta de informações. “Ele pode estar dormindo no chão, sem comer, mas precisa estar vivo”, desabafou a mãe.
João concluiu o ensino médio na Milford High School em maio deste ano e é mais um entre vários jovens da comunidade escolar que foram detidos recentemente pelo ICE, o que tem causado medo entre estudantes e pais. Procurado, o órgão de imigração não respondeu sobre o caso do jovem.
Outros casos semelhantes ocorreram na cidade nos últimos meses. No início do mês, Gustavo Henrique Reis Oliveira, de 16 anos, também foi detido pelo ICE perto da Main Street e liberado posteriormente. Em maio, Marcelo Gomes da Silva, de 18 anos, foi preso a caminho do treino de vôlei e ficou seis dias detido em uma cela no subsolo. Nenhum dos jovens possui antecedentes criminais.
Dados oficiais apontam que o número de imigrantes sem registros criminais detidos pelo ICE já supera o de pessoas com condenações ou acusações pendentes. A presença do órgão federal em Milford se intensificou após o início da chamada Operação Patriot 2.0, lançada pelo governo Trump para reforçar a fiscalização migratória na região.
A família Carmo vive nos Estados Unidos desde 2018, quando entrou no país com visto de turista, atualmente vencido. Ana trabalha como faxineira e o pai, José Ferreira do Carmo, atua na construção civil.
No dia seguinte à prisão de Marcelo Gomes, a Milford High School realizou a cerimônia de formatura, marcada por protestos de estudantes contra as detenções. Na ocasião, João recebeu o “Seal of Biliteracy”, reconhecimento estadual concedido a alunos com alto nível de proficiência em inglês e outro idioma. Ele também jogava futebol na escola e sonha em ser encanador para ajudar a família.
No domingo, a igreja frequentada por João em Framingham não transmitiu o culto ao vivo, como de costume. Ele é voluntário responsável pelas redes sociais e tecnologia da congregação. João é descrito como um jovem religioso, que mantém uma bíblia ao lado da cama.
Após saber da prisão do filho, Ana pediu ajuda ao melhor amigo de João, Raphael Magalhães Britto, que foi até a Main Street e encontrou o carro do jovem com o vidro do passageiro quebrado e a carteira de motorista sobre o teto. Raphael conheceu João no sexto ano da escola Stacy Middle School e conta que o amigo sempre o apoiou nos estudos e na fé. “Sinto muita falta dele. Quero saber como ele está. Ele é como um irmão para mim”, afirmou.
O pai de João destaca que o filho é obediente, prestativo e querido pelos vizinhos. Para a mãe, é difícil imaginar o futuro do filho longe dos Estados Unidos. “Ele se apaixonou por este país. Sou muito grata. Amo o que faço. Se tivesse que ir embora, seria com o coração muito pesado”, disse Ana.
A irmã mais nova, Clara Valentina, de 8 anos, chora ao falar do irmão e sente falta do ritual de dar boa noite antes de dormir. No sábado, sem saber onde João estava, a menina teve dificuldades para dormir.
A família segue aguardando, na esperança de receber notícias sobre o paradeiro e as condições de João Marciano do Carmo.
Foto: Andrew Burke-Stevenson para The B
Fonte: Boston Globe